A Luz

Texto por: Ninfador
Mudanças sempre fizeram parte da minha vida. Por causa do trabalho de gerente executivo, da minha mãe, sou obrigada a constantemente mudar de estado, de escola, de amigos; sou obrigada a mudar completamente de vida. Ao longo dos meus dezessete anos, já morei em dez estados diferentes, e estou partindo para o décimo primeiro: Sergipe.
Sergipe será o primeiro estado do nordeste no qual vou morar. O trabalho da minha mãe, nunca tinha nos levado para tão longe; longe entre aspas, pois para quem vive em constante mudança, nenhum lugar é tão longe.
Mesmo sabendo que a qualquer momento vou ter que deixar tudo que construí em um lugar para trás, acabo fazem amigos e me apegando a eles. As despedidas deveriam ficar mais fáceis com o passar do tempo, com a experiência e a certeza que sempre irão acontecer. Mas, nunca são fáceis; lágrimas e mais lágrimas, textões de despedida, abraços e mais abraços. É sempre a mesma coisa... A mesma tristeza... O mesmo sentimento ruim de perda.
Às vezes ouço minha mãe chorando, por conta disso. Ela deve se sentir bastante culpada, por fazer com que sua única filha, tenha que sempre abandonar tudo que construiu, por causa do seu emprego. Quando era mais nova, não entendia muito bem o motivo para tantas mudanças, entretanto, hoje em dia, já consigo entender. Alguém tem que trabalhar para sustentar a família; mesmo sendo apenas eu e minha mãe, as coisas nunca foram fáceis e ela sempre trabalhou muito para me dar tudo de melhor. Infelizmente, o trabalho dela, não nós permite criar vínculos e raízes em nenhum lugar. Mas é a vida... É a nossa vida.
A papelada da troca de escolas já foi feita. Para minha sorte, o período letivo da escola em que estudava, já tinha acabado quando a notícia da mudança chegou até nós. Foram poucas vezes que tive tal sorte; na maioria dos casos, sempre iniciava o ano letivo em uma escola e finalizava em outra. Isso é horrível para o aprendizado, pois as escolas nunca estavam na mesma sintonia, algumas estavam mais adiantadas e outras mais atrasadas, em relação aos assuntos estudados. E como estou indo para o terceiro ano do ensino médio, o último ano de escola, essa sorte veio no momento certo.
Todas as coisas relacionadas à mudança já estão prontas; móveis embrulhados, malas feitas, casa limpa, contas pagas. Estamos apenas esperando o caminhão que irá fazer a mudança chegar, para colocar tudo que temos nele, e partirmos mais uma vez. Nossa espera dura cerca de quinze minutos, até ouvirmos uma buzina vinda da rua.
Como tudo era pago pela empresa na qual minha mãe trabalhava, eles sempre mandavam o mesmo caminhão, com o mesmo motorista. O senhor Carlos, era um homem com seus 57 anos, branco, estatura baixa e com uma barriguinha de chope. Sempre de muito bom humor, ele sempre foi muito gentil conosco; dá para ver em seu olhar, que ele realmente ama o seu trabalho.
Minha mãe e eu, o ajudamos a colocar todas as coisas no caminhão. Assim como em todas às outras vezes, o caminhão saiu antes de nós; para não ter perigo de chegarmos à nova casa e as coisas ainda estarem a caminho. Após uma longa e última olhada no meu quarto, partirmos rumo ao hotel que ficaríamos até a manhã seguinte, quando finalmente seguiríamos rumo a Sergipe.
Tive uma boa noite de sono, pois a cama do hotel era bastante confortável. Tomamos banho e café no hotel; após o checkout, entramos no carro e partimos rumo ao nosso destino. Sergipe fica a dois dias de viagem do Rio Grande do Sul, então faremos mais duas paradas para dormir, em outros hotéis antes de chegarmos. As viagens com minha mãe sempre foram tranquilas; nós cantamos, conversamos sobre a vida, sobre o futuro, sobre garotos... Sempre pude ser cem por cento aberta e sincera com ela, e nossa relação, depois que entendi o quando ela se sacrificava e trabalha por mim, ficou muito boa.
Nossas duas paradas para dormir não foram tão satisfatórias, pois ficamos em motéis de beira de estrada, com camas desconfortáveis. Porém foram apenas duas noites, nada que estragasse a viagem. Assim como o previsto, dois dias após nossa partida, finalmente chegamos a Sergipe.
A nova casa, assim como o caminhão de mudanças, foi arranjada pela empresa na qual minha mãe trabalha. Ela era bem maior que a antiga, muita mais espaçosa e com mais cômodos. Tinha um belo e pequeno jardim logo na entrada, era pintada inteiramente de branco no seu exterior, com tons de azul claro no seu interior. Seu piso era de mármore branco; possuía quatro quartos e uma suíte, três banheiros, um escritório, uma área de lazer e uma piscina. Sim! Eu tinha uma piscina em casa! Saber que tínhamos uma piscina levantou um pouco mais o meu animo. Aquela casa é a melhor casa em que já moramos, com toda certeza do mundo.
Como o caminhão da mudança tinha saído um dia antes de nós, todas as nossas coisas já estavam desempacotadas e arrumadas. Não muito bem arrumadas, mas sei que o senhor Carlos fez o máximo que pode, para deixar tudo certinho para nós.
Minha mãe deixou escolher o quarto que mais me agradava, para ficar com ele. Logo que minha escolha foi feita, ela me ajudou a levar minhas coisas até ele e arrumá-lo. Assim como o resto do interior da casa, suas paredes eram pintadas em algum tom de azul claro, chão de mármore branco, tinha um ventilador de teto e uma janela com vista para a piscina.
Minha mãe ficou com a suíte, é claro; muito maior que os outros quarto, tinha um banheiro próprio com uma hidromassagem, um guarda-roupa bastante espaçoso e um mini escritório. Em vez de um ventilador de teto, que nem o meu quarto, tinha um ar-condicionado; que pelo o que ouvir falar sobre Sergipe, minha mãe iria utilizá-lo frequentemente. Saímos do Rio Grande do Sul para Sergipe, da geladeira para o forno; demoraríamos um tempo para nos acostumar com o clima.
Fomos dormir, com a promessa que no dia seguinte iriamos visitar minha nova escola. Minha primeira noite de sono, na nova casa, foi tranquila; sonhei com a nova escola, mesmo sem sequer conhecê-la, sonhei com um campo de flores e um lindo céu azul... Bons sonhos. Por causa dos sonhos, acordei feliz e animada para conhecer logo a nova escola. Após tomarmos café da manhã, partimos em direção a ela.
Minha nova escola não ficava longe de casa; uns dez minutos de caminhada. O que me deixou muito mais feliz, pois não precisaria pegar nenhum tipo de condução para chegar até ela. Era uma escola da rede particular, com três prédios. Para falar a verdade, um desses prédios parecia ser uma igreja vista de longe, com duas torres de sino. Sua arquitetura inteira lembrava uma igreja. Já os outros dois prédios, eram construções típicas de escolas, grandes caixas de tijolos e cimento.
Fomos muito bem recebidas pela diretora da escola, que nos levou para conhecer todas as instalações, de todos os três prédios. O primeiro prédio era onde ficavam as salas de aula. Elas eram bem normais, possuíam um quadro negro e um branco, cadeiras arrumadas em filas e uma mesa para o professor perto da porta de entrada.
O segundo prédio era o que mencionei que parecia uma igreja. E para minha surpresa, aquela construção era realmente uma igreja. A escola foi fundada por um padre jesuíta, por isso possuía uma local de cunho religioso. A diretora falou que não precisávamos nos preocupar, pois mesmo tendo uma igreja dentro da escola, eles respeitavam todas as formas e expressividades religiosas e que não iam obrigar ninguém a participar das missas. Ouvir isso me deixou bastante aliviada, pois ao contrário da minha mãe, eu não sou religiosa; acredito em Deus, entretanto não sigo nenhuma religião em especifico.
O terceiro e último prédio era uma quadra poliesportiva. Era o lugar onde aconteciam as aulas de educação física e os treinos dos times da escola: futsal, basquete, vôlei e handebol. Possuía sete fileiras de arquibancadas em cada lado da quadra, redes de proteção para os espectadores e um piso liso, com marcações para os esportes.
O tour pela escola foi bom para mim, pois assim pude conhecer as suas instalações e alguns professores, que mesmo sendo férias, estavam ali produzindo seus planos de aula para o ano letivo, que começaria em uma semana.
Voltei para casa mais animada do que tinha saído, bastante ansiosa para o começo das aulas. Embora a escola tenha uma igreja em seus domínios, não serei obrigada a participar de suas missas, e poderei usar esse tempo para estudar mais para o ENEM. É meu último ano de escola, o sonho da universidade federal é real para mim. Sei que sou muito privilegiada por sempre ter estudado em escolas particulares, porém não posso relaxar e devo continuar me preparando muito bem para o exame. Quero ser psicóloga; a mente humana sempre foi um grande mistério para mim e isso me deixa animada para saber mais sobre ela. Além do que, sendo psicóloga, poderei ajudar as pessoas a superar traumas e problemas. Acho que essa é minha missão nesse mundo... Ajudar as pessoas.
A semana que faltava para começo das aulas serviu para comprar os fardamentos, os materiais e livros exigidos pela escola, serviu para conhecer um pouco melhor a vizinhança e me acostumar com o clima do estado. Confesso que esse último ponto foi o mais difícil, por várias tardes da semana, apenas fiquei na piscina para amenizar o calor.
Quanto mais se aproximava o dia do início do ano letivo, mais ansiosa eu ficava. Mal consegui dormir direito no final de semana que antecedeu o início. O medo e a empolgação do novo eram os sentimentos que mais sentia. Na segunda-feira começaria mais um novo capítulo na história da minha vida; iria conhecer novas pessoas, novas histórias, fazer novas amizades... Mesmo sabendo que posso ter que me mudar a qualquer momento, não me privo de fazer amigos. Esse é um dos pontos positivos de ter vivido em vários estados, ter pessoas para visitar quando estiver de volta a eles.
A segunda-feira finalmente chegou.
Acordei bem mais cedo que o recomendado por minha mãe, a ansiedade estava me matando. Pela primeira vez vou estudar pela manhã; como o trabalho dela é período integral, manhã e tarde, terei a casa só para mim durante todas as tarde. Isso será ótimo para meus estudos, paz e tranquilidade. Não que ela seja barulhenta, mas silêncio para estudar, nunca é demais.
Como tinha acordado bem mais cedo, fiquei deitada na cama. Quando a hora certa para levantar chegou, minha mãe já tinha saída para o trabalho. Tomei banho e café, coloquei o uniforme da escola, dei aquela última conferida no material para ver se tudo estava correto e parti rumo a meu primeiro dia de aula.
A escola estava diferente da última vez que tinha a visto, não somente pelos balões e cartazes de “boas vindas”, mas também por está cheia e muito barulhenta. Crianças corriam por todos