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O Mercado: a Renascença

Foto do escritor: Luca PiñeyroLuca Piñeyro

Atualizado: 27 de jun. de 2021

Aracaju, anos 90, o Centro é coroa de dia e cara de noite. De um lado da moeda, funcionam os três poderes do estado democrático, agências bancárias, empresas e o comércio popular; do outro, ocultos na sombra, os sem teto, a prostituição de variados gêneros, o crack. Uma dessas situações que as elites não sabem se ignorar, se criminalizar ou se encarar de uma vez.

Por esses anos circula no mundo a ideia da ‘gentrificação’. É um termo cunhado na sociologia urbana, na década de 60; define o momento em que um espaço abandonado de uma cidade recebe um investimento inicial e passa atrair um público de renda elevada. A operação em geral implica a expulsão dos antigos moradores que, em algum momento, ficam impossibilitados de bancar o custo de morar nesse espaço revalorizado.

O Centro de Aracaju precisava de muito investimento. Até pelos mandatários eleitos, que não podiam não ver, de manhã cedo, os restos dos aquelarres que ali aconteciam pelas noites. E chegou por fim o tempo da mudança e, como vamos ver, deu-se quase meio como resgate, quase meio como gentrificação.

Foto: Destaque Notícias


Em princípio, enfrentaram-se dois projetos. O prefeito Almeida Lima queria construir um novo Mercado na avenida Marechal Rondon e converter o que já existia em centro turístico; prometia um novo espaço para 1700 feirantes e 1500 pontos de venda. O outro projeto, mais coerente e que acabaria tendo a aprovação do governador Albano Franco, propunha a reforma do antigo mercado.

A disputa era acirrada, a Associação Comercial de Sergipe propôs a realização de uma audiência para escutar mais detalhadamente as propostas. Almeida Lima declinou, preferiu esperar. Vinham as eleições, podia ganhar seu aliado Jackson e não precisaria de tantas voltas para que seu projeto fosse aprovado.

Mas venceu Albano é começou a reforma do Mercado e do Centro. Para isso era necessária não só construção, mas também derrubadas. E nesse ir e vir das ondas, alguns feirantes perdiam seus lugares no espaço antigo sem que ainda estivesse assegurado seu lugar no novo.

No primeiro sorteio de postos, no 14 de abril de 1999, foram outorgados 1022 boxes. Defesa Civil, Bombeiros e Polícia Militar ajudaram no transporte das mercadorias e bancadas. Mas, ao chegar ao novo lugar, os feirantes se encontraram com as instalações elétricas ainda pelo chão e boxes menores que os do antigo mercado. Alguns se resistiram a continuar com a mudança nessas condições, mas a Emsurb lhes cortou a energia elétrica e os obrigou a migrar. Teve arrastão pelo centro da cidade, duas lojas danificadas, um preso, confrontos com soldados da Guarda Municipal. “PMA usa da violência com feirantes”, diz a Gazeta de Sergipe de 23 de abril.


Na primeira chuva intensa, no 29 de abril, o mercado alagou; perdera-se muita mercadoria e os mesmos feirantes tiveram que fazer um mutirão para tirar a água. As falhas na obra já tinham sido detectadas e informadas, pela fiscalização, mas as coisas seguiram como se nada.

Em maio de 1999, são sorteados os últimos 790 boxes do Mercado Albano Franco. Há novamente tumultos e pancadaria. Ainda não há espaço para todos e as autoridades não pensaram no que poderia ser feito por aqueles feirantes que viviam e deviam agora estar parados. Mas a estética, por seu lado, dava os primeiros resultados: o processo de limpeza descobria antigos detalhes arquitetônicos.

No dia 23 desabou a marquise do Albano Franco. Procuraram-se responsáveis e, enquanto isso, as obras continuaram avançando e também os conflitos entre as autoridades e os feirantes. Nesse mesmo mês, foi o Mercado Leite Neto e nesse lugar construiu-se a Praça de Eventos Hilton Lopes.

Ali, no 15 de setembro de 2000, o Mercado foi inaugurado com um show de Chiko Queiroga e Rogério, Amorosa e Simone. Na propaganda, a prefeitura dizia: “Resgatando o passado e construindo o futuro”.

Em 20 de dezembro de 2017, atendendo à legislação que proíbe o nome de pessoas vivas em prédios públicos, o prefeito Edvaldo Nogueira castigou o atrevimento do Albano, mudando o nome do mercado para o da mãe do ex-governador.


Os dados foram extraídos da dissertação de mestrado: O Mercado Municipal de Aracaju e seus tempos: princípio, perda e reinvenção (1926-2000), de Andrea Rocha Santos Filgueiras.

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